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Mostrando postagens de novembro, 2025

Meduse

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Meduse: um corpo mítico que atravessa gêneros Artista: Lydia Guerreiro Desde a Antiguidade, a figura da Medusa tem sido cristalizada como o símbolo da mulher-monstro: aquela que, punida por existir e transformada em ameaça, carrega no olhar o poder de petrificar. No entanto, a mitologia — assim como a arte — está sempre aberta a deslocamentos, revisões e expansões. Meduse, escultura em argila, nasce justamente desse espaço de reinvenção. Ao invés de fixar a criatura no campo do feminino demonizado ou do masculino heroico, Meduse opera em uma zona intermediária, onde o gênero se dissolve e dá lugar ao arquétipo. A figura não é “ela” nem “ele”, mas uma presença que reúne traços fluidos: o rosto alongado, a boca entreaberta em expressão de espanto ou revelação, e os elementos serpentiformes que emergem da cabeça como pensamentos em movimento. Essa escolha amplia o imaginário da lenda. A Medusa clássica é frequentemente lida como metáfora da punição do feminino. Meduse, por sua vez, desloc...

A beleza e os desafios de chegar bem aos 56 anos

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A beleza e os desafios de chegar bem aos 56 anos Chegar aos 56 anos é como abrir uma porta que, por muito tempo, imaginamos distante. E, de repente, estamos ali: de pé no limiar, percebendo que não se trata de uma chegada, mas de uma espécie profunda de continuidade — mais consciente, mais seletiva, mais nossa. Aos 56, o corpo fala de outras maneiras. Ele já não se apressa por qualquer motivo, já não deseja correr para acompanhar expectativas alheias. Ele deseja presença. Há uma maturidade que nasce justamente do que se perdeu, do que se deixou ir, do que se descobriu impossível sustentar. E, nesse aparente desgaste, há uma beleza que não se pode imitar: a beleza de quem sabe o próprio peso e o próprio ritmo. Mas não é um caminho sem desafios. A sociedade costuma tratar a mulher de meia-idade como um território que já entregou tudo. Como se a vitalidade tivesse prazo, como se a criatividade se esgotasse, como se a sensibilidade amadurecida fosse sinônimo de apagamento. No entanto, é ex...

Grupo Commedia dell’arte

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Uma Semana Dentro da Commedia dell’Arte Por Lydia Guerreiro Em julho, mergulhei em um território onde o corpo fala antes da boca e onde cada gesto carrega séculos de memória: a Commedia dell’arte. A imersão aconteceu no Teatro da Praça, na Zona Norte de São Paulo, sob a condução precisa e generosa de Daniel Granieri — ator, pesquisador e um verdadeiro guardião dessa linguagem ancestral. Foram sete dias que pareciam suspensos no tempo. A cada manhã, entrávamos no estúdio como quem abre uma porta secreta, deixando do lado de fora nossas expressões habituais, nossas biografias e até nossas hesitações. Ali dentro, éramos moldados pelas máscaras, ensinados por elas. Há algo de profundamente transformador em permitir que o rosto desapareça para que outra presença emerja: mais arquetípica, mais crua, quase selvagem. Os personagens: velhos, servos e enamorados Experimentamos os principais tipos da tradição — os velhos pesados e cômicos, os zanni incansáveis, os enamorados que se movem como se ...